Novo serviço pago do Youtube pode ajudar a salvar - e expandir - a indústria da música
Por Pedro Burgos | Pedro Burgos – qui, 13 de nov de 2014
O Google anunciou ontem o Youtube Music Key (YMK), o seu produto de música por assinatura que estará disponível a partir da próxima segunda-feira nos Estados Unidos e alguns países da Europa. A ideia: você paga um valor mensal (no início, 8 dólares, depois 10) e tem direito a ouvir e assistir o que quiser sem anúncios; baixar seus favoritos para ouvir offline e deixar a música do Youtube tocando em background no seu celular. A princípio, nada revolucionário: o mercado de música por assinatura já é cheio de concorrentes competentes, como Spotify, Deezer, rdio, Xbox Music e Beats. Mas a entrada do Youtube no ramo pode ser um dos momentos mais importantes para a cambaleante indústria cultural na internet, por vários motivos.
O primeiro é que as pessoas se acostumaram a não pagar um centavo por música online, primeiro por coisas como Napster e outras ferramentas de download pirata. E depois, de forma legal, com a ascenção de sites como o próprio Youtube, financiados pela publicidade. Hoje, dá pra ouvir quase qualquer música do mundo, basta colocar na busca do site de vídeos ou Spotify e aguentar aqueles segundos de publicidade eventual (meu sobrinho com dois anos já havia se condicionado a clicar em “Pular Anúncio”). Depois de um tempo, não foi só o público que se acostumou a não pagar. As gravadoras, vendo as vendas de CDs e downloads minguarem, se renderam ao novo sistema. Todas já têm algum tipo de acordo com o Google e ganham fração de centavos por cada execução dos vídeos (na verdade ganham pela publicidade que vem antes). O caso mais famoso é do coreano PSY, que ganhava menos de 2 dólares a cada mil visualizações, mas como seu Gangnam Style tocou mais de 2 bilhões de vezes, isso rendeu alguns milhões a ele.
A chegada do YMK, que poderia ser considerada a versão freemium do Youtube, pode fazer com que não só as pessoas se acostumem de alguma forma a pagar por música, como ajudem a fornecer uma outra forma de renda aos músicos, já que muitos artistas não gostam de ter suas composições associadas a marcas que eles não endossam. Afinal, a pode parecer “grátis” hoje em dia, mas a forma que nós consumimos só esconde quem está pagando. Há um monte de artistas no Brasil que “dão o disco de graça”, mas que na verdade são bancados por Lei Rouanet ou por empresas como Oi e Natura, que têm editais que financiam a produção de álbuns. Fazer com que o público, e não o anunciante, pague pela música, parece uma ideia “antiga”, mas mais sustentável no longo prazo. E é legal que o Google, antigo defensor de que tudo tem de ser grátis, entre na onda.
A segunda questão importante no lançamento do YMK é que o conceito de “música” está mudando, e o Youtube tem uma enorme culpa disso. O que é ótimo! Hoje as pessoas curtem e compartilham não apenas as músicas originais dos grandes artistas, mas covers, dublagens inusitadas, paródias, coreografias (vide o fenômeno Harlem Shake), pout-porris (o primeiro hit do Youtube foi Evolution of Dance) e outras formas inclassificáveis. Coisas como o Pentatonix não seriam possíveis nem em rádios (muitos direitos autorais para negociar) nem em uma MTV da vida, mas encontram no Tubo a casa perfeita (e milhões de cliques):
Esses amadores, na definição literal, apaixonados por música, que entregam uma arte diferente,remixada, estiveram por muito tempo isolados da indústria e dos outros artistas. O Youtube pode de certa forma “legalizá-los”. O YMK promete repartir a sua receita com todo mundo que se inscrever, baseado no número de execuções – o que permitiria criar uma parada de sucessos bastante inusitada, com Beyoncé no topo seguida da criança assistindo o clipe da Beyoncé, com os pais e a própria cantora levando algum dinheiro na jogada. É claro que o labirinto de pagamento de royalties parece complicadíssimo. No caso de uma cover a capella usando composições de 40 artistas diferentes, alguns em domínio público, como repartir a bolada? Se o Google achar uma solução para isso – como já o fez, de certa forma, com seu ContentID, ele criará uma nova forma de sustentar artistas e compositores. Esses precisam de novas soluções tecnológicas desesperadamente, que precisam ir além do recém-criado botão de doação do Youtube.
E, por último e não menos importante, o Youtube Music Key pode ser um balão de ensaio para experimentos mais ousados. Como disse o pessoal do Mashable, “a música pode ajudar a consertar o Youtube, e o Youtube pode ajudar a consertar a indústria musical”. Se o experimento der certo e o Google conseguir muitos assinantes, por que não criar um canal de humor por assinatura? Com curadoria e Porta dos Fundos e afins, sem publicidade antes? Na prática, o Google já tem em seus servidores uma programação melhor que qualquer emissora jamais sonhou. Resta ele resolver como entregar isso de maneira mais cômoda – e como resolver a equação do preço ideal. Será interessante acompanhar os próximos capítulos. Pagos, obviamente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário