A fotografia está protegida pelo artigo 7º, inciso VII, da Lei de Direitos Autorais (Lei 9.610/98).
De acordo com a lei, os direitos morais do autor lhe permitem
reivindicar a qualquer tempo a autoria, ter seu nome indicado na
utilização da obra e assegurar sua integridade, opondo-se a quaisquer
modificações ou à prática de atos que possam prejudicá-la.
Mas nem sempre a fotografia esteve protegida no domínio do direito do
autor. O professor português José de Oliveira Ascensão, no livro
“Direito Autoral”, explica que isso foi acontecendo aos poucos e de
forma tímida em comparação com as demais manifestações artísticas. Para
ele, a rigor, a fotografia deveria estar fora de proteção quando
representasse mera transposição do objeto exterior.
Se é certo, segundo o ministro Luis Felipe Salomão, que fotógrafos
talentosos e famosos, como Sebastião Salgado, têm garantido o
reconhecimento de sua obra como manifestação artística das mais
sofisticadas, também é verdade que diversas formas de fotografia não têm
a mesma pretensão. Seria o caso daquelas feitas unicamente para
registro de documentos e os famosos selfies para autoexibição nas redes sociais, que não demandam maiores questionamentos.
Arte
Na legislação anterior sobre direito autoral (Lei 5.988/73),
a fotografia era passível de proteção desde que, pela escolha de seu
objeto e pelas condições de sua execução, pudesse ser considerada
criação artística. Em referência a essa lei, Ascensão acredita que o
direito brasileiro trilhava caminho mais permissivo em relação a outros
países, o que poderia ser perigoso.
Há, segundo ele, fotografias que podem ter um grande valor para
documentário, mas que não cabem nos quadros do direito do autor. A
fotografia tremida que um amador casualmente tirou de um acidente pode
ser disputada a peso de ouro pelas revistas e jornais, mas não tem valor
artístico, de forma que não pode ser protegida pela norma.
O ministro Salomão explica que apesar da sólida construção
doutrinária acerca do tema, com um propósito de objetividade,
simplificação e redução das controvérsias, a lei atual (Lei 9.610) abriu
por completo o conceito de fotografia como sendo manifestação artística
protegida, retirando a restrição contida na antiga legislação. “Não se
nega que há, realmente, proteção de direitos autorais à obra
fotográfica, descabendo perquirir acerca de sua natureza”, afirma o
ministro.
Ensaio fotográfico
Em outubro deste ano, o ministro Salomão foi relator de um processo
no qual se discutiu se modelo tem direitos autorais em relação a ensaio
fotográfico (REsp 1.322.704).
No caso, a Quarta Turma negou pedido formulado pela atriz Deborah
Secco para que a Editora Abril a indenizasse pela publicação de fotos
extras na revista Playboy, em 2002. Para o colegiado, a
divulgação de sua imagem como foto de capa em edição especial de fim de
ano não caracterizava ofensa a direito autoral da modelo porque "a
titularidade da obra pertence ao fotógrafo, e não ao fotografado".
Luis Felipe Salomão, ao proferir seu voto, fez algumas considerações
sobre como a lei, a doutrina e a jurisprudência tratam o tema. O
entendimento da Turma foi que a modelo fotografada não goza de tal
proteção, porque nada cria. Sua imagem comporia obra artística de
terceiros. No caso, a modelo seria titular de outros direitos, relativos
à imagem, honra e intimidade.
O fotógrafo, sim, é que seria o detentor da técnica e da
inspiração, pois é ele quem coordena os elementos complementares ao
retrato do objeto, como iluminação. “É ele quem capta a oportunidade do
momento e o transforma em criação intelectual, digna, portanto, de
tutela como manifestação de cunho artístico”, afirmou o relator.
Omissão de autoria
Grande parte dos processos sobre direitos do autor de fotografia no
âmbito do STJ envolve a publicação não autorizada de fotos ou sua
publicação em revistas ou jornais sem indicação de autoria.
De acordo com julgados do STJ, a simples circunstância de as
fotografias terem sido publicadas sem indicação de autoria é o bastante
para justificar o pedido de indenização por danos morais, sendo
irrelevante a discussão acerca da extensão do consentimento do autor (REsp 750.822).
Há julgados que afirmam que a omissão de autoria fere frontalmente os
direitos do autor, não constituindo mero dissabor ou aborrecimento. A
publicação apócrifa de uma obra intelectual, além de submetê-la à
exaustão expositiva, torna anônimo o trabalho do artista, fato que por
si só justifica uma compensação (REsp 1.367.021).
Guias rodoviários
Na análise do caso concreto, um fotógrafo se disse surpreendido com a
publicação sem autorização de três de suas fotos na capa de guias
rodoviários. De acordo com o artigo 102 da Lei 9.610, aquele que tiver
sua obra fraudulentamente reproduzida, divulgada ou de qualquer forma
utilizada tem direito a indenização.
O artigo 103 da lei dispõe que aquele que editar obra sem autorização
do titular perderá para este os exemplares que se apreenderem e lhe
pagará o preço dos que tiver vendido. Nesse processo, o fotógrafo pediu,
além da indenização moral, o perdimento dos exemplares editados com
violação do direito de autor.
O artigo 102, segundo a ministra Nancy, fixa sanções civis e seu
objetivo é inibir práticas semelhantes. O art. 103, por sua vez, também
assume um caráter indenizatório, na medida em que prevê a perda dos
exemplares e o pagamento daqueles que tiverem sido vendidos em favor da
vítima. Assim, numa visão sistêmica dessas normas, conclui-se que elas
criam uma via de mão dupla, mas nem sempre precisam ser aplicadas
concomitantemente.
Errata
Segundo a ministra Nancy Andrighi, há situações em que as sanções não
compensarão de forma plena e satisfatória os prejuízos da vítima,
exigindo complementação a título de indenização pelos danos sofridos.
Haverá casos, entretanto, em que a própria indenização cumprirá
satisfatoriamente não apenas a função de ressarcir a vítima pelas suas
perdas, como também de desencorajar a conduta ilícita.
“Diante disso, cabe ao julgador, no uso do seu arbítrio, interpretar
em cada caso os comandos dos referidos dispositivos”, afirmou. Nesse
processo julgado, as fotos foram publicadas na capa de guia rodoviário e
a decisão de primeiro grau determinou a inclusão da errata nos
exemplares ainda não distribuídos.
A ministra observou que a inclusão de errata tornou desnecessária
qualquer medida tendente a evitar a circulação de novos exemplares das
obras. E como se tratava de guias rodoviários, as fotos não constituíam
elemento impulsionador de vendas.
“Em geral, a motivação de compra dessa espécie de guia se dá muito
mais pelo seu conteúdo interno do que por razões estéticas – notadamente
mapas, tabelas e referências quanto a postos de abastecimento,
restaurantes e hotéis”, disse a ministra.
Distribuição gratuita
A Lei de Direitos Autorais dispõe que eventual ressarcimento pela
publicação indevida deve ter como parâmetro o número de exemplares
vendidos. Ocorre problema quando a divulgação é feita de forma gratuita,
pois a lei não traz expressamente menção a esse fato. Nesses casos, a
solução é a aplicação do artigo 944 do Código Civil, segundo o qual “a
indenização mede-se pela extensão do dano” (REsp 1.158.390).
Em 2004, um fotógrafo teve suas fotos publicadas em revista destinada
a promover o Carnaval do Rio de Janeiro. O juízo de primeiro grau
determinou o pagamento de indenização como se os exemplares tivessem
sido vendidos. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), por sua
vez, entendeu que a indenização deveria considerar o valor que o
fotógrafo recebe pela comercialização de suas obras.
O STJ manteve o entendimento do TJRJ, ao argumento de que nem mesmo
se houvesse comprovação do número de revistas vendidas seria possível,
no caso, fixar o valor da indenização com base no preço do produto
acabado. Isso porque as fotografias eram duas entre numerosas outras
contidas na publicação, o que dificulta a mensuração de valor.
Segundo o ministro Massami Uyeda (já aposentado), não é a presença da
obra artística fotográfica na revista que define integralmente seu
valor. É necessário ponderar com razoabilidade em que medida as fotos
contribuem para o sucesso do produto final, sob o risco de
enriquecimento ilícito do titular da obra.
No trabalho
A jurisprudência do STJ considera que a fotografia, ainda que
produzida na constância da relação de trabalho, integra a propriedade
intelectual do fotógrafo.
O empregador cessionário do direito patrimonial da obra não pode
transferi-lo a terceiro, especialmente se o faz onerosamente, sem
anuência do autor. No entanto, pode utilizar a obra que integrou
determinada matéria jornalística para ilustrar outros produtos
congêneres da mesma empresa (REsp 1.034.103).
De acordo com o artigo 49, inciso VI, da lei, não havendo
especificação quanto à modalidade de utilização, o contrato será
interpretado restritivamente. Havendo dúvida quanto aos limites da
cessão de direitos autorais, esta deve ser resolvida sempre em favor do
autor, cedente, e não em favor do cessionário (REsp 750.822).
Conforme a lei, o prazo de proteção aos direitos patrimoniais sobre
obras fotográficas é de 70 anos, a contar de 1º de janeiro do ano
subsequente ao de sua divulgação.
Em qualquer modalidade de reprodução, a quantidade de exemplares
deverá ser informada e controlada, cabendo a quem reproduzir a obra a
responsabilidade de manter os registros que permitam ao autor a
fiscalização desse aproveitamento econômico.
Disponível em: http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/sala_de_noticias/noticias/ultimas/A-fotografia-no-foco-da-jurisprud%C3%AAncia
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