terça-feira, 11 de junho de 2013

O que eu aprendi com a minha primeira falência

Esse post foi publicado originalmente em Outubro de 2011 no blog da empresa que eu estava fechando. Foi um momento de reflexão no qual eu pensei sobre os erros, as dificuldades, os acertos e o aprendizado de ir à falência.


O início
Em Novembro de 2009 eu tive uma necessidade de vender minhas coisas usadas para juntar dinheiro para viajar e anunciei os produtos em minhas redes sociais. Foi então que eu tive uma inspiração: E se nós juntássemos redes sociais e Comércio Eletrônico?
Em Janeiro de 2010 eu fui para os Estados Unidos e voltei. Cumpri o meu objetivo de cursar a disciplina Gestão de Projetos em Harvard e tirar o certificado TOEFL. E foi em Março de 2010 que eu decidi me dedicar integralmente ao empreendimento, além de terminar a Universidade.
Eu venho de uma formação e histórico profissional não tradicional para empreendedores de Tecnologia. Eu me interessava por empreendedorismo social e era fascinado por um tema em especial: os negócios sociais.
Sendo assim, eu desejava não somente criar um negócio de sucesso, mas que ele tivesse um objetivo social. Eu estava empreendendo não só uma empresa, mas um ideal: O de ganhar bem fazendo o bem.
E, de fato, esse é um tema em ascensão no mundo todo e que já está criando uma nova indústria, o Impact Investing. No Brasil já existem fundos de investimento, aceleradoras e Think Tanks como a Artemísia desenvolvendo essa nova indústria. E o problema deles, pensava eu, é que faltam boas ideias e empreendedores.
Dificuldade n.1: As diferenças de cultura entre os mundos do Empreendedorismo Social e Tecnológico
De Março de 2010 até Julho de 2010 eu fui reconhecido por várias organizações que têm o objetivo de apoiar empreendedores sociais. Fui um dos 28 Jovens Líderes do Brasil pela AUI (www.aui.org.br), um dos 60 Global Changemakers da America Latina pelo Brisith Council, e ganhei uma bolsa integral para o programa Usina de ideias da Artemísia (www.artemisia.org.br).
O mundo do Empreendedorismo Social valoriza o Idealismo e tem a cultura de ajudar e confiar uns nos outros, e que os resultados esperados estão na quantidade de pessoas que você ajuda e nas vidas que transforma. Nesses lugares eu fui incentivado a pensar grande e a ter a certeza de que uma pessoa pode concretizar qualquer coisa. E eu comecei a empreender uma empresa privada do ramo tecnológico com esse mind-set.
O nome da empresa já era um enigma: Ahimsa. Difícil de lembrar, difícil de pronunciar, mas cheio de significado (não violência, em hindu). E o projeto de Social Commerce veio a se chamar Camboo.
E quando eu comecei eu pensei que por conta da missão social do empreendimento todos iam querer ajudar. No entanto, o que aconteceu foi que as pessoas ficavam desconfiadas que eu estava usando a missão social para ganhar dinheiro.
Erro n.1: Começar o empreendimento sozinho.
Nos primeiros meses do empreendimento eu até tive a oportunidade de ter sócios. Um deles era meu amigo mas tinha um perfil muito parecido com o meu: a mesma formação e a mesmo jeito idealista e criativo. Éramos ótimos amigos, mas sabia que não trabalharíamos bem juntos.
Eu fui aconselhado por muitas pessoas a procurar um sócio, e até fui conversar com alguns possíveis interessados, mas sempre havia algum problema: A pessoa era excelente tecnicamente mas não podia se dedicar a um novo empreendimento. Ou a pessoa tinha um outro projeto de vida e não queria empreender. Ou a pessoa não me conhecia o suficiente para se tornar meu sócio.
Dificuldade n. 2: Eu não conhecia pessoas de outras áreas para formar uma equipe multidisciplinar.
Então eu decidi começar sozinho mesmo. Afinal, a sorte favorece os bravos e nada é impossível, certo?
Sucesso n.1: Incubação no Porto Digital.
Foi aí que aconteceu uma coisa que foi decisiva: um edital para incubação no Porto Digital. O programa tinha o objetivo de apoiar grupos com ideias nascentes com espaço físico, mentorias e consultorias. E eu decidi tentar.
De 62 projetos submetidos, o meu foi um dos aprovados para a banca que era composta por acadêmicos, profissionais e empreendedores. Para a minha surpresa, eles receberam o meu projeto muito bem. Aplaudiram as coisas que eu falei duas vezes e, mais tarde fiquei sabendo que tive a 3a melhor nota de todos os projetos submetidos.
Uma coisa em especial chamou a atenção deles, foi o fato de eu ter feito uma pesquisa com usuários da internet sorteando o meu Ipod para quem convidasse mais pessoas para responder. Eu fiquei surpreso como as pessoas do mercado dão valor à metodologia científica. Mas o interesse deles foi por outro motivo que eu não entendi na hora. Eles interpretaram que ao apostar o meu Ipod eu estava muito comprometido com o projeto e conseguia fazer muita coisa com poucos recursos. Prestem atenção que isso foi a base para um erro no futuro.
E quando eu comecei a incubação a minha empresa era o patinho feio da incubadora. Um cara só, não técnico, e tentando resolver um problema dificílimo. Ninguém botava muita fé em mim. Até que foram acontecendo outras coisas boas.
Fomos finalistas do Prêmio Santander de Empreendedorismo em 2010 e conseguimos 100 mil reais em investimento anjo da parte de outra empresa do Porto Digital. Depois disso a minha empresa virou a Rock Start da incubadora e eu era parabenizado o tempo todo na Universidade. Ninguém mais me subestimava.
Sucesso número 2 e 3: Investimento Anjo de outra empresa e Finalista do Prêmio Santander.
Na virada do ano de 2010 para 2011 eu estava nas núvens, e jurava que seria o próximo Zuckerberg e que a minha empresa seria o próximo Google. Isso fez acontecer uma coisa muito ruim: Eu me tornei arrogante por causa do sucesso e passei a não ouvir as pessoas e a subestimar os riscos.
Erro n.2: Me tornei arrogante por causa do sucesso e passei a correr riscos demais
Não apenas isso, como vinha do mundo do empreendedorismo social e lá eu era incentivado a sonhar grande e ser idealista, eu comecei a dizer coisas que as pessoas do mundo empresarial estranhavam. Em especial, escrevi um post no blog que me queimou muito, foi o “Porque a Microsoft, Google e Facebook têm medo da Ahimsa (http://ahimsasocial.tumblr.com/post/5934030556/medodaahimsa). Isso fez com que várias pessoas achassem que eu era megalomaníaco e minou a confiança deles em mim.
Meus investidores começaram a ter dúvidas sobre mim e me pressionavam por resultados.
E quando você recebe investimento aumenta a complexidade da gestão. Você passa a ter que prestar contas, a ouvir a opinião. Nesse momento eu era aconselhado pelos investidores, pela incubadora e pelo meu professor orientador do TCC.
Dificuldade n. 3: Eu não sabia quem deveria escutar.
Eu não sabia quem eu deveria escutar, as pessoas davam conselhos conflitantes. Os investidores diziam pra oferecer serviços pro mercado e faturar para ser auto-suficiente, o pessoal da incubadora dizia para validar o modelo de negócio e a Academia dizia para fazer uma pesquisa de mercado.
Então eu dividi esforços em três frentes.
Erro n.3: Eu tive que fazer três coisas diferentes e perdi o foco no meu negócio.
Como até então eu só havia tido sucessos, eu achava que era “O Cara” com uma capacidade de persuasão sobre-humana e que conseguiria convencer qualquer pessoa a fazer qualquer coisa. Então eu botei na cabeça de ir aos EUA para tentar captar mais recursos lá. As pessoas tentaram me avisar o quanto seria difícil, mas eu não ouvi. Eu tinha certeza absoluta que ia dar certo, e não parei na possibilidade de não dar.

Quando eu cheguei lá eu ouvi coisas do tipo “Social Entrepreneurship is Bullshit” de um investidor de risco, ou então, “a ideia é interessante, mas eu não investiria no Brasil pois acho que é uma bolha”.
Dificuldade n. 4: A realidade Brasileira não é o que agente vê nos filmes e lê nos blogs americanos. Nós não estamos no Vale do Silício.
Quando eu voltei meus investidores-anjo perguntaram: Quantos milhões você conseguiu? E estavam arretados porque a viagem não deu o resultado esperado.
Erro n. 4: Eu não calculava o custo benefício de cada ação e não pensava na possibilidade de dar errado.
Mas depois do investimento anjo eu tinha recursos para uma equipe financiada pelo investidor e achava que não precisava de ninguém como sócio. Como era divertido você selecionar e contratar pessoas. Eu me achava importante ao dizer que tinha uma equipe. Mas aí começaram as dificuldades em reter as pessoas.
Dificuldade n. 4: Dificuldade em reter e motivar a equipe.
Primeiro foi um estagiário em mídias sociais. Ele tinha muita energia e entusiasmo, mas só ficou na Ahimsa por 3 semanas. Ele tinha mais perfil de empreendedor e saiu para iniciar sua própria empresa. Depois disso eu concluí que o problema é que a oportunidade não era boa o suficiente, e consegui com os investidores recursos para dois estagiários, um em mídias sociais e um em T.I.
Depois, com um salário melhor eu selecionei uma pessoa com CV ótimo para mídias sociais, só que ela só durou 2 semanas até que foi contratada pelo concorrente. Achei outra pessoa com um perfil bom, mas o estagiário em T.I. durou dois meses porque tinha que se concentrar nos estudos. Então consegui dois bolsistas de reuso de software, e selecionei um estagiário em designer. Eu tinha uma equipe de 5 pessoas com perfil complementar e trabalhando no projeto, mas aí surgiram as dificuldades.
Eu tinha feito algumas seleções sem falar com os investidores e eles não gostaram disso. Começaram a me pressionar para eu faturar e ser auto-sustentável financeiramente e de repente eu tinha que me concentrar em três coisas: 1) Prestar serviços em mídias sociais e faturar, 2) Construir um cluster de negócios sociais em Recife e 3) desenvolver o produto.
Erro n.3: Perdi o foco no desenvolvimento do produto.
Eu dispersei o esforço da equipe em três coisas diferentes e acabei não fazendo nenhuma das três direito. E aí começou a cobrança por parte dos investidores e da incubadora. E eu fui perdendo a paciência e parei de ser diplomático.
Erro n.4: Perdi a paciência com as pessoas e comecei a provocá-las.
Com os meus professores na Universidade eu disse que aprendi que se não tivesse coragem e ambição iria acabar virando um professor, e, ao me formar, dei um livro de Paulo Freire para cada um para eles refletirem sobre a educação. Com os meus investidores eu comecei a fazer coisas sem eles concordarem e com os gerentes da incubadora eu perguntei que se eles sabiam tanto porque não estavam empreendendo.
O resultado é que o empreendimento avançou bastante conceitualmente, mas todo o resto ficou parado. Fiz um plano de negócios completíssimo e perfeito do ponto de vista das ciências administrativas que me fez ter um 10 no meu TCC. Eu estava seguindo as sugestões de meu professor orientador de fazer uma pesquisa pela internet com muitos respondentes a fim de tirar conclusões estatísticas sobre as preferências das pessoas. “Isso vai lhe trazer mais e melhores investidores”, ele dizia. Daí eu gastei significativos tempo e recursos com isso, e depois acabei com mais de mil respondentes e sem tirar nenhuma conclusão significativa.
Erro n.5: Comprometi muito tempo e recurso numa coisa que não valia a pena para o negócio
E o pior de tudo, o fato de que eu gastei tanto tempo e recursos com isso fez com que que as pessoas pensassem que eu era pródigo e meus investidores ficassem ressentidos comigo por ter tomado essas decisões sem combinar com eles.
Mas uma semana depois de terminada a pesquisa ela estava desatualizada. Fizemos até um projeto de responsabilidade social para angariar doações para a Cruz Vermelha em Pernambuco. Mas meus investidores não gostaram da falta de resultados práticos e tiveram que parar de investir devido a outras prioridades financeiras.
Minha equipe sentiu isso imediatamente. Os funcionários precisam ter confiança na saúde e no futuro da organização, do contrário eles acabam pulando fora. Só ficando os dois bolsistas de T.I. porque são de outra cidade e recebem uma bolsa da CAPES.
Então eu resolvi seguir somente a metodologia de Startups. E a minha primeira ação foi tentar achar um sócio técnico.
Dificuldade n.6: É muito difícil achar um sócio no meio do caminho.
Conversei com algumas pessoas e até achei um cara muito legal que topou ser o gestor de projetos da equipe. Mas ele tinha um outro trabalho e um filho recém-nascido. Sendo assim não pode dedicar muito tempo e depois pediu para sair.
Nesse meio tempo alguns meses se passaram e as pessoas foram perdendo a fé em mim e na minha ideia. Eu submeti o projeto à várias oportunidades como aceleradoras e competições, mas não tive sorte.
Foi pior ainda pois tenho certeza que uma aceleradora a qual apliquei mostrou o meu projeto para um concorrente que já está no ar, pois eles copiaram a ideia e usaram as mesmas palavras e frases que coloquei na aplicação.
Então nas últimas semanas eu comecei a perceber que tinha perdido o tesão pela ideia e já não tinha tanto prazer como antes de ir para o trabalho. Quando você para de amar o que está fazendo é o sinal de que precisa aplicar os seus talentos em outras coisas.
Em Novembro de 2011 eu decidi não continuar mais empreendendo o projeto Camboo. Mas não desisti de ser empreendedor nem de acreditar no dinheiro como um meio para um fim, que é mudar o mundo.
O resultado.


E agora, olhando para trás, qual foi o resultado do projeto?
  1. Passei um ano e meio trabalhando obsessivamente numa ideia sem nenhum retorno financeiro. Nesse período eu me afastei dos meus amigos e ganhei 10kg.
  2. Estou com uma dívida de 13 mil reais no Porto Digital pelo tempo de incubação a qual vou passar os próximos dois anos pagando.
  3. Estou me sentindo um completo perdedor e não sei o que fazer da vida agora.
Mas olhando pelo lado positivo:
  1. Abri um negócio antes mesmo de terminar a faculdade, ganhei o respeito e reconhecimenteo dos meus colegas e professores e terminei a minha graduação com chave de ouro.
  2. Adquiri muita experiência e fiz um bom networking no ramo da inovação e tecnologia.
  3. Descobri que amei ser empreendedor e que vou tentar de novo quantas vezes for preciso até conseguir o sucesso.
  4. Aprendi MUITO sobre os negócios e sobre a vida. Por exemplo:
  • Nunca comece um negócio sozinho. Tenha um sócio com habilidades complementares e com uma mentalidade parecida.
  • Tenha MUITO cuidado ao gastar o dinheiro dos outros, pois está em jogo não somente o dinheiro mas a sua reputação.
  • Quando você não souber a quem escutar, vá para os teóricos da Metodologia de Startups que eles têm a resposta para suas perguntas.
  • A palavra que melhor define o empreendedor é “Resiliência”, a capacidade de superar adversidades e contratempos. Como disse Rocky Balboa: “A vitória nem sempre pertence àquele que bate mais forte, mas àquele que consegue apanhar mais e continuar lutando”.
  • Faça o que você ama, e quando deixar de amar vá fazer outra coisa. Porque é a sua paixão pela ideia que lhe mantém motivado quando tudo o mais parece fracassar.
  • Você não deve ter medo ou vergonha do fracasso. Mas ao invés disso abraçá-lo como um aprendizado e a oportunidade de melhorar.


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